segunda-feira, 13 de junho de 2011

Do lodo ao lótus

Na maternidade, quando pela palmada golpeado fui, o epíteto de Hades nos pródromos do porvir assinalava. Brincadeiras de criança: chanfalho, açoite e ferrão, sevícias da perdida infância, prematuro salto para o adulto obscuro mundo adentrei, não tardando da casa sair em refúgio para bem longe do cárcere dos irmãos meus.
A liberdade da rua confundida é com poder fazer o que quer, pois, da dominação dos verdugos paternos para os déspotas miseráveis passei. A noite iluminada pelo Sol para dormir seguro é, na contramão dos viventes seres, e a cada dia vivia sem rumo nem poesia.
Crisálidas de esperança em adotado ser, albergava ainda, na ingenuidade pudica da tenra idade, insólito lenitivo a manter o compasso do coração.
Na escuridão do abismo laico, em resposta ao desiderato por um ósculo humano, o céu chorava-me em compaixão sendo suas lágrimas as únicas criaturas que ousavam tocar o trôpego corpo.
Ao acolhimento da mãe Natureza, em abnegada faina, percebia que o poder da rainha indiferença, limites neste mundo continha.
Nas migalhas espalhadas pelo chão, feliz com os irmãozinhos voadores, aquiescentes da presença minha, banqueteávamos no salão nobre de nossa democrática corte, emoldurada pela diversidade de cores harmônicas e embalada pela insólita orquestra onomatopéica.
Da árvore frondosa, morada caridosa, confortável triclínio oferecia: no fruto, na sombra, no abrigo, velava-me no esplendor do espírito maternal.
Às vezes, não resistia, e da solidão emergia saudosas longínquas lembranças não vividas, mas suave brisa assinalava companhia.
E do sonho terreno desperto fui, olhos inundados represavam o pranto até último instante que se revelaria o casal de anjos guiado por um archote, a penumbra descortinar. Abriram-se as comportas em rios e afluentes as lágrimas de alegria na visão de meu galardão quando mamãe e papai de outra era carregavam-me no colo, embalados por coro de meninos:
“Bem aventurados os pobres de espírito, porque deles é o reino dos céus;
  Bem aventurados os que choram, porque serão consolados;
  Bem aventurados os mansos, porque eles herdarão a terra;
  Bem aventurados os que têm fome e sede de justiça, porque serão fartos...”

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