quarta-feira, 13 de julho de 2011

Caminhos

Nos confins do planeta, onde nem o homem e nem os animais ousam dominar, gigantes de pedra se erguem ladeados aos céus. A cordilheira, entrincheirada, recebe nas ordens do Criador pelo sibilar das cortantes rajadas do vento, a missão de proteger o continente. Sentinela da terra oferece repositório, com mais intensidade no inverno, a criaturas inócuas que jazem em seus alvos gélidos vértices, ensejando o despertar na estação seguinte.
A disciplina do movimento contínuo dos astros, mais uma vez é sentida, quando a Terra bafejada pelo Astro Maior conclama os seres a exaltar as cores da Vida.
Aquelas criaturas são acordadas, como por encanto, pela fusão das partículas luminosas à robustez da superfície congelada nos cimos das montanhas. Cada gota despertada consubstancia seus elementos materiais àquela intangível que lhe criou: a Luz. Ignora a condição lucífera, mas inicia sua senda guiada em automatismo por força gravitacional, desconhecida, a impulsioná-la colina abaixo.
Duas delas, já cônscias de si, entreolham-se num golpe de vista, admiradas pela semelhança e travam breve diálogo, cada qual carreando consigo as conquistas amealhadas até aquele ponto do percurso. Almas gêmeas firmam pacto de fidelidade a denotar o grau de identificação que se estabelecera, mas, apesar da aparente sintonia, guardam diferentes vontades não declaradas, que em breve se evidenciaria.
                Na visão de alegre caravana a formar pequeno córrego, distribuindo sorrisos e gentilezas, a dupla é convidada a se unir ao grupo, que apresenta a filosofia do amor ao Oceano e a todas as gotas, revelada por Aquele a quem seguem. A reação dicotômica das duas sela os destinos díspares das amigas: uma busca a felicidade compartilhada, a outra a satisfação de seus desejos.
                A congregação se fortalece com mais uma integrante que contribui para acelerar a jornada de todas. O caminho estreito a ser trilhado é árduo e muitas sucumbem desertando suas missões: requer confiança no Líder, que vai a frente de todas, e disciplina na aplicação de Seus ensinamentos. A recruta corresponde em obediência e abnegação, colaborando com a marcha coletiva. Recorda da antiga amiga emitindo pensamentos das melhores estimas, rogando o reencontro no Oceano profetizado pelo Mestre.
                Em outra instância, a recalcitrante emprazada a repousar, frena sua descida ao encontro do ambicionado repasto. Descortina-se formoso lago adornado por pomposa flora a hospedar suas semelhantes em frenesi hedônico. Vive-se, ali, como se não houvesse o amanhã e cada um por si sorve o máximo das possibilidades oferecidas naquela perspectiva. Num átimo, o charco ulterior ao lago desfaz a aparente beleza e euforia que cedem lugar a obscuridade do pranto e ranger de dentes quando as bactérias da indolência e iniquidade dizimam todos os seus habitantes.
                Evaporadas, sobem aos céus de onde podem ver com mais acuidade os desatinos empenhados na ilusão das conquistas fugazes. Sofrem a imolação no sopeso da sentença condenatória da própria consciência, alcunha da Luz, que em verdade são. A observância da Lei se faz imperativa na precipitação, aos quais aqueles arrependidos espectros retornam ao mesmo habitat de outrora na forma de chuva. A alma gêmea transviada, agora renascida, recebe nova oportunidade de reencontrar seu antigo amor caso aceite palmilhar junto ao pequeno córrego que a espera de braços abertos.

Nenhum comentário:

Postar um comentário